domingo, 28 de junho de 2009

Das procissões dionisíacas ao palco das tragédias

As procissões dionisíacas contavam a história da vida do deus Dioniso, de um modo análogo às procissões da Semana Santa cristã, em que a vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo é relembrada.
Na vida de Dioniso, há dois momentos bastante diferentes: quando ele é destruído pelos Titãs (morte, tensão) e quando ele renasce (alegria, extroversão). Já sabemos que estes dois momentos têm significados relacionados ao ciclo da natureza, no qual a semente fica enterrada por alguns meses, para enfim, surgir, germinada. No momento da morte de Dioniso eram entoados cantos, tristes e solenes, chamados ditirambos. A tragédia é uma forma dramática surgida na Grécia, no século V a.C., originada do ditirambro (canto em louvor a Dioniso). Etimologia (origem) da palavra tragédia: tragos (bode) + oide (canto) = canto do bode, animal que relembra um dos "disfarces" usados por Dioniso.
O desenvolvimento do pensamento grego apresenta dois momentos fundamentais: século XVI a.C. até o século IX a.C., quando a sociedade e o pensamento apoiavam-se no mito para encontrar explicações para os fenômenos na natureza e para a vida em geral. E a partir do século VIII a.C. quando surge a pólis, o pensamento filosófico e a valorização do racional, que vão recusar a visão de mundo anterior (baseada no pensamento mítico).
O teatro surge como novidade artística, na Grécia do século V a.C., trazendo normas estéticas, temas e convenções próprias. Pode-se dizer que o teatro explica o contexto histórico de século V, da mesma forma que o contexto daquele momento se apreende melhor através das peças então produzidas, demonstrando a profunda interrelação entre sociedade e teatro.
Festival de Teatro
O teatro grego nasceu da religião e mesmo após todas as transformações pelas quais passou não perdeu de vista as suas origens. As representações dramáticas em Atenas realizavam-se três vezes por ano, por ocasião das festas dionisíacas:
Dionísias Urbanas ou Grandes Dionísias - eram celebradas na primavera (fins de março) e freqüentadas por toda a população grega, além de embaixadores estrangeiros. A festa durava seis dias. O primeiro era consagrado a uma solene procissão, em que toda a cidade tomava parte. Nesta procissão se levava a estátua do Deus Dioniso que era finalmente colocada na orquestra do Teatro de Dioniso. Nos dois dias seguintes celebravam-se os concursos de dez coros ditirâmbicos. Os concursos dramáticos ocupavam os três últimos dias. Eram escolhidos três poetas trágicos, que representavam, cada um deles, sua obra inteira, num mesmo dia. Ou seja, três tragédias e um drama satírico (tetralogia).
Leneanas - tinham um caráter mais local. Celebravam-se no inverno, fins de janeiro e duravam de três a quatro dias. Uma procissão, de cunho extremamente licencioso e um duplo concurso e comédias e tragédias, eram as atrações da festa.
Dionísias Rurais - celebravam-se apenas nos "demos" (povoados) nos fins de dezembro e eram as mais antigas festas de Dioniso, dependendo o brilho de tais festejos dos recursos do demos.
A preparação das "Grandes Dionísias" ficava sob a responsabilidade de um funcionário do governo que recrutava os coregos (cidadãos ricos que patrocinavam os coros) e com isso, garantia a produção do espetáculo. A coregia era um dos serviços públicos impostos pelo Estado ateniense aos cidadãos ricos. Com financiamento garantido, tanto para os ensaios quanto para as representações teatrais, que se realizavam obrigatoriamente três vezes ao ano, o corego recrutava atores, profissionalizava-os, selecionava os poetas competidores, encarregava-se da parte organizacional do espetáculo, garantia o acesso de todos os cidadãos aos espetáculos, com direito a uma ajuda de custo para o pagamento dos ingressos e das refeições nos dias de festivais, para os mais pobres.
A especialização das atividades teatrais atinge tal nível na Atenas clássica que o Estado estabelece uma legislação sobre o fazer teatral, estipulando critérios de seleção dos atores para os principais papéis e seus substitutos, distribuição dos personagens e recrutamento dos coreutas (integrantes do coro que contracenavam com os atores).
No final dos concursos dramáticos realizava-se um julgamento, de onde resultava a classificação final dos concorrentes. Eram três categorias premiadas: poetas, coregos e protagonistas. Essa classificação era votada por um júri, que dava seu veredicto sob forma de voto secreto.
As representações em Atenas começavam pela manhã. E se assistia ao espetáculo com uma coroa na cabeça, como nas cerimônias religiosas. As mulheres atenienses, embora não pudessem participar da cena, podiam assistí-la como espectadoras, pelo menos da tragédia. Quanto à comédia, devido a certas liberdades inerentes ao gênero, não era freqüentada pelas atenienses mais "sérias".
Por Elza de Andrade

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Origem do Teatro

É comum ouvirmos dizer que o teatro começou na Grécia, há muitos séculos atrás. No entanto, existem outros exemplos de manifestações teatrais anteriores aos gregos. Por exemplo, na China antiga, o budismo usava o teatro como forma de expressão religiosa. No Egito, um grande espetáculo popular contava a história da ressurreição de Osíris e da morte de Hórus. Na Índia, se acredita que o teatro tenha surgido com Brama. E nos tempos pré-helênicos, os cretenses homenageavam seus deuses em teatros, provavelmente construídos no século dezenove antes de Cristo. É fácil perceber através destes poucos exemplos, uma origem religiosa para as manifestações teatrais.
No entanto, podemos olhar ainda mais para trás quando lembramos que o teatro é a imitação de uma ação e que o ato de imitar está presente na essência dos mais primitivos rituais que conhecemos. É através da imitação que a criança se desenvolve aprendendo a falar e a agir. Comparando este homem primitivo com uma criança, podemos observar que ambos são completamente ignorantes em relação ao universo que os cerca. E muito provavelmente, este homem, ansioso por encontrar respostas para as suas perguntas, tenha começado a construir um acervo de mitologias, religiões e rituais, numa tentativa de explicação do mundo, dos fenômenos naturais, da vida, do nascimento, da morte.
Na história do pensamento humano o mito surge como uma tentativa de explicação, compreensão e controle do mundo. É através do mito que o homem primitivo tenta compreender os fenômenos da natureza, atribuindo-lhes uma origem divina. A palavra mitologia está ligada a um conjunto de narrativas da vida, das aventuras, viagens, afetos e desafetos dos mitos, dos deuses, dos heróis. Existem diversas mitologias: cristã, egípcia, hindu, grega etc... A palavra religião, do verbo latino religare (ato de ligar) pode ser definida como o conjunto de atitudes pelos quais o homem se liga ao divino. Através da realização dos ritos/rituais o homem relembra os mitos. Por exemplo: no ritual da missa cristã, uma série de procedimentos relembram a vida, morte e ressurreição de seu principal mito, Jesus Cristo.
O famoso antropólogo Malinowski propõe que "o mito não é uma explicação destinada a satisfazer uma curiosidade científica, mas uma narrativa que faz reviver uma realidade arcaica, que satisfaz a profundas necessidades religiosas, aspirações morais, a pressões e imperativos de ordem social e mesmo a exigências práticas. Nas civilizações primitivas, o mito desempenha uma função indispensável: ele exprime, exalta e codifica a crença; protege e impõe os princípios morais; garante a eficácia do ritual e oferece regras práticas para a orientação do homem. O mito é um ingrediente vital da civilização humana; ele é uma realidade viva, à qual se recorre incessantemente; não é, absolutamente, uma teoria abstrata ou uma fantasia artística, mas uma verdadeira codificação da religião primitiva e da sabedoria popular".
Mas e o teatro?
A origem do teatro ocidental está ligada aos mitos gregos arcaicos e à religião grega. A mitologia grega é formada por numerosos deuses imortais e antropomórficos, isto é, que têm a forma e o temperamento humano; os deuses antropomorfizados amam, odeiam, perseguem, discutem, sentem ciúme, são vingativos, traem, mentem como as pessoas comuns. Existem várias gerações e famílias divinas na mitologia grega.
Por Elza de Andrade